segunda-feira, 19 de setembro de 2022

Coisas de Escritório

Ninguém gosta das segundas-feiras. Primeiro que já está errado a semana começar no segundo dia. Isso já vai dizer que tem algo que não bate. Então: acorda, banho, dentes, roupa, café, trânsito. “Bom dia, chefe” é frase dita pensando “vá tomar no meio do olho do seu...”. Ainda assim, certas coisas fora do normal aliviavam esse peso. Sobre isso, era a assistente do outro... do 5º andar, a mulher parecia um desastrinho flutuante. Eu gostava de subir lá não para ficar vendo relatório com o Alves, qualquer e-mail resolvia. Mas pra assisti-la fazendo malabares tentando não derrubar um copo de café da Bucks ou desviando de uma divisória muito “perigosa” pelo caminho. Quando dava, as mesas eram até próximas, eu ajudava. Eu sempre ria da coisa toda apesar do apoio moral. E foi rindo que um dia reparei  por trás das lentes do óculos dela: Jess era linda. Foi surpresa notar com tamanho atraso aquele rosto que parecia medido matematicamente, os grandes olhos castanhos preocupados se eu ia mesmo conseguir impedir seu tropeço ou cairia junto com ela. Não caímos, se é que surgiu a curiosidade. Mas foi assim que começou.

A partir daí, da quase queda, começamos a nos cumprimentar mais quando nos víamos, a nos perceber mais nos espaços entre uma pasta e outra que magicamente voava das suas mãos. Jéssica media 1,75m e nisso éramos iguais. Seu cabelo comprido e do mesmo castanho escuro dos olhos, tinha um cheiro quase imperceptível mas que também já começava a me distrair durante os cafés na lanchonete perto do escritório.  Por conta disso, de perceber tudo aquilo, fui pego por duas ou três vezes reparando. Entre semi-risos e desvios, numa dessas ocasiões, falou-se do clima e de prazos. Como já estávamos no nível de comentarmos as  conversas de canto da empresa, voltamos à normalidade com um “Você soube...” dito por ela de forma a criar muita curiosidade, um assuntinho. Quis saber daquilo atentamente, mesmo que não fosse nada demais – tanto porque, no final das contas, era só “vazou” que a gerente vinha almoçando com um estagiário no almoxarifado. Coisa essa que não se podia confirmar, o garoto ria e mudava de assunto, o que só melhorava tudo.

Apesar da situação me parecer favorável, procurava me manter em certa neutralidade de amigo do trabalho. O que não foi muito adiante porque quando notei, estava perguntando a ela sobre, se ela iria ao happy hour em um daqueles momentos de conversa…

- Então, disse mudando de assunto, você vai naquela paradinha depois do expediente ali no bar do…?

- Olha, Rique, veio dizendo em disfarçada atenção, tava meio querendo e meio com preguiça. E esse salto, olha aqui – dobrou a perna quase caindo pra mostrar o salto, – um terror.

- O único perigo aqui, é você. Vai acabar caindo aí… Enfim, eu vou. Tanto porque a série do… acabou. E não seria de todo mal.

- É…, então a gente vai se encontrar por lá, menino. Muito bom. Vou pra minha mesa agora, adiantar o que der. Sextou…

Ri disso e e retribui o “sextou”. Voltei pra minha mesa porque também teria de correr com algumas coisas. Algum desocupado tinha marcado uma reunião pras 15h, outra daquelas que 2 e-mails e um cigarro teria resolvido. Também por isso o dia correu rápido, na ansiedade que têm as sextas-feiras. Aquele ruído de fundo um pouco mais animado que nos outros dias, um riso ou outro mais solto entre as mesas. 

Foi por volta das 18h30 que vi Jessy, nós já no barzinho, saindo do banheiro e vindo me minha direção, no balcão do bar. Tentava se fazer notar no caminho, não que precisasse. Chegou sorrindo, perguntou se eu estava naquela reunião e respondeu “se fodeu rs” quando balancei a cabeça triste e positivamente enquanto afrouxava a gravata. Aquele riso, disse a ela muitas noites depois, foi pesado. O Jameson sem gelo já martelava ideias na minha cabeça. 

A cerveja dela chegou. Levantou a long neck em movimento de brinde mas estava perto demais, olhando “grande” demais. Segui com o meu copo e com meu corpo em direção a ela. Perto demais. Ao som do choque entre copo e garrafa, a ouvi dizer…

- A gente vai MESMO fazer isso, Henrique?

- Me parece, Jéssica, que já estamos fazendo…

- É, já estamos... Vem cá.



(Foto por: THIAGO KLAFKE em @thiagoklafke)


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